26.5.03

Valente em Cannes (27)
- Crimsom Gold (Sang et Or), de Jafar Panahi - O filme que fechou a sessão Un Certain Regard é o novo trabalho do realizador de O Balão Branco e que ganhou o Leão de Ouro em Veneza por O Círculo, tendo aqui ainda o roteiro de Abbas Kiarostami. Panahi faz um filme de uma secura dolorosa, que começa com um plano-sequência onde a combinação do que se mostra com o que está fora da tela (mas muito presente pelo som) cria um dos inícios de filme mais impressionantes em muito tempo. A partir dele entramos num flashback, no qual seguimos a vida do personagem apresentado no primeiro plano e tudo que o levou até a situação do início do filme. Panahi filma este personagem lado a lado e nos mostra uma fissura de classes na sociedade iraniana que, não por acaso, vai nos lembrar muito o Brasil. O personagem principal pode ser visto, inclusive como uma versão iraniana do nosso O Invasor, só que com o detalhe importantíssimo que sua invasão não é nem "pedida" pela classe mais alta (como no contrato do filme de Beto Brant), nem é proposital e premeditada como a do Anísio de Paulo Miklos. Assim sendo, os tons aqui são bem mais naturalistas e o resultado final muito menos cínico do que no filme brasileiro, mas o jogo entre classes e o painel traçado podem ser assemelhados. Um último elogio ao filme de Panahi: depois de três filmes muito bem recebidos, ele dá aqui um passo rumo a uma narrativa mais sombria, mais lenta e mais sutil nos seus efeitos, provando ser um cineasta importantíssimo no panorama atual.
(Eduardo Valente)