5.5.04

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Na edição de abril da Cahiers du Cinema circula uma carta da ACID (Associação dos Cineastas Independentes), entidade francesa que congrega (como co-signatários da carta, inclusive) nomes como Chantal Akerman, Jean-Jacques Beineix, Nicolas Philibert, Rithy Pahn, entre tantos outros. Na carta os cineastas declaram-se preocupadíssimos com a possível morte de um cinema independente, sufocado pelo ritmo suicida do rodízio de filmes nas salas "alternativas", cada vez mais limitadas em quantidade pelo número de cópias das grandes estréias, pelo excesso de filmes em cartela e pela invasão do circuitinho pelos "proto-filmes de arte" dos grandes produtores. Com isso, uma produção que não conta com massivo investimento em mídia, e que portanto precisaria de tempo para chegar ao conhecimento do público (pela via do boca-a-boca ou da circulação de críticas, etc), estava sendo tratada na mesma lógica extrema do "box office" de lançamento, que rege as mega-produções hollywoodianas - que, no entanto, são hoje operações de marketing de tamanho bizarro para compensar o rodízio com lucros enormes nas primeiras semanas. Além de registrar sua preocupação os cineastas franceses propõem uma medida: limitar em lei o número de cópias que um mesmo filme pode ter em exibição no país ao mesmo tempo - democratizando assim, um pouco, a oferta de produções em cartaz. Para além de discutir esta proposta é importante ver como a situação descrita pelos franceses bate com a situação brasileira - onde os distribuidores pequenos parecem devorar uns aos outros na guerra pelo mínimo espaço do circuito "de arte" - que é cada vez mais uma reprodução em escala menor da guerra do circuitão. Recentemente, o Rio de Janeiro viu a morte anunciada, por exemplo, de um dos principais filmes brasileiros em anos: O Prisioneiro da Grade de Ferro entrou com três ou quatro cópias na cidade, e na segunda semana tinha dois horários na sala 2 do Estação (com 40 lugares). Difícil é imaginar no Brasil uma resposta como a francesa, coletiva e organizada, seja de cineastas ou dos distribuidores menores (ambos em risco) - aqui continua imperando a lógica do cada um por si, como sempre foi. E, como a Globo Filmes não tem o menor interesse na questão por enquanto (até porque associada aos mesmos distribuidores "majors" que seriam afetados por um possível limite "por lançamento"), vamos ver mesmo a definhação dos filmes de risco - processo mundial, como estamos vendo.
Eduardo Valente