19.8.05

A curiosa simbiose do cinema e seu público

Cena 1: Cinemas patrocinados pelo Unibanco
Tudo bem, já foi até motivo de uma das primeiras notas publicadas neste blog as esquisitíssimas estratégias dos publicitários responsáveis pelas vinhetas que o Unibanco exibe nos seus cinemas. Afinal, naquela vez ficamos chocados com a admissão dos ditos cujos de que, com o público selecionado do cinema, podiam perder um pouco o pudor de falar "pra quem tem dinheiro" que às vezes se precisa ter na universalizada TV (pra quem não lembra era um comercial com algumas pessoas dizendo os seus "sonhos" que o Unibanco podia tornar verdade - coisas como "um colar de pérolas verdadeiras" etc e tal). Depois vem a ainda mais esquisita campanha de Miguel Falabella e Debora Bloch interpretando um casal, que são eles mas não são, ou seja, um "me engana que eu gosto" oficializado, onde os limites entre ficção e vida de celebridade eram constantemente quebrados para afirmar a excelência do banco.
Mas, agora, parece que eles passaram do limite, não? As novas e numerosas vinhetas do Unibanco passaram do live action para a animação, para assumir de vez a objetificação do cliente do banco. Atentidos por humanizadas figuras de bancários, temos os clientes representados como pequenos carrinhos em miniatura (no comercial da seguradora) ou até mesmo como sacos de pipoca absolutamente iguais, numa vinheta do próprio cinema. Repetidas a exaustão (não raro elas passam em digital e logo depois em película de novo), as vinhetas são de uma honestidade quase desconcertante na sua admissão da uniformização do cliente-espectador como um objeto que dá ao banco-cinema o prazer de gastar o seu dinheiro, comer sua pipoca etc e tal. Uma gracinha, já diria a Hebe.
(...)
Cena 2 - Festival de Gramado
Curiosa inversão, onde passa longe o cinema num Festival chamado como "Festival de Cinema". Se em torno do tapete vermelho do Palácio do Festival da serra gaúcha o que vemos é uma aglomeração de pessoas aos berros interessadas por ir lá ver as celebridades globais, na Rede Globo a notícia nos telejornais que vão, er, "cobrir o evento", mostra sempre a mesma imagem: a destas pessoas que gritam na porta do Palácio. Claro, numa cidade pequena do Rio Grande do Sul, a novidade é poder ver os atores que entram pelas telinhas das pessoas, mas que vivem geralmente no circuito São Paulo-Rio. Já na telinha da mesma TV, os atores estão em cena o tempo todo, então a notícia, o diferente, é mostrar o público aos berros - ou seja, a celebridade para a cobertura da TV é o frenesi que ela mesma criou.
Como ponto em comum entre uns (público) e outros (cobertura da TV), só mesmo uma coisa: o absoluto desinteresse pelos filmes que passam no Festival de, bem..., Cinema.
Eduardo Valente