26.7.06

Para registro - 2

Aconteceu na tarde/noite de segunda-feira um seminário organizado pela Secretaria Nacional de Cultura do PT, na sede do Tá Na Rua, na Lapa, aqui no Rio. Havia a presença, tanto na mesa quanto na platéia, de diretores da Ancine (Nilson Rodrigues, Manoel Rangel - e Gustavo Dahl na platéia), um deputado (Luiz Sérgio), o secretário do audiovisual Orlando Senna, o presidente do Sindicato da Indústria Cinematográfica Paulo Thiago, entre outros... e, claro, Luiz Carlos Barreto.
Rolou uma quase-polêmica na primeira mesa sobre a velhíssima questão entre escolher estreantes ou velha guarda nos concursos de fomento - quando Paulo Thiago defendeu algo que ele definiu como "direitos históricos adquiridos". Para maiores detalhes, o Globo publicou hoje uma reportagem do Bruno Porto sobre o assunto.
Olha, nem discordo de que os balcões para estreantes e para velha guarda devem ser diferentes não - eu e outros já escrevemos isso aqui na Contra. Mas, assim, sendo bem franco, é meio bizarro que seja justo o Paulo Thiago a fazer uma defesa dessas. Primeiro porque não se trata de um cineasta que venha sendo preterido nos editais, de forma alguma (fez quatro filmes na última década, todos com orçamento considerável e patrocínio das empresas de sempre com os mecanismos de incentivo); segundo porque tampouco se trata de um cineasta de grande público ou de prestígio - apesar de ter assinado doze longas, entre eles uma das produções mais caras da história do país (A Batalha dos Guararapes). Curiosamente, é esse o cineasta que representa o sindicato da "indústria cinematográfica" do Brasil - e é quem fala em "direitos históricos adquiridos".
Numa boa, eu sei que é chato e equivocado personalizar a questão, mas as pessoas às vezes precisam ter uma perspectiva mais crítica daquilo que defendem.

Mas nem era isso que eu queria deixar registrado (inclusive porque a matéria do Globo já deixou tudo implícito), mas sim algumas frases da noite. Sobretudo as de Barreto.
Olha, é muito sintomático que o Partido dos Trabalhadores tenha chamado o Barreto para participar dessa mesa, representando... bem, representando o Barreto. "Costumam me chamar de Barretão, mas o verdadeiro Barretão é a Lucy". Em determinado momento o Rodrigo Guerón, cineasta, tomou a palavra e, antes de fazer a pergunta, comentou que a presença do Barreto impressiona (nas palavras do Rodrigo, "intimida") - e eu concordo, o cara tem carisma. Eu já entrevistei o Barreto uma vez e já escrevi um artigo sobre ele, e isso é algo que realmente chama a atenção. E não é que, após uma avaliação histórica bastante interessante, o homem resolve dizer, ali no palco, que não quer ser um eterno beneficiário do apoio do Estado? Falou sim! Disse: "Eu não quero ser o beneficiário do dinheiro público, depender eternamente do patrocínio das leis de incentivo". Eu JURO que ele disse isso (e há várias outras testemunhas). Quando perguntado, ele mais uma vez evitou responder por que motivo há muitos filmes caros que não dão bilheteria. Mas, enfim...
Vamos ver o que vem aí em Nossa Senhora do Caravaggio, o filme mais recente de seu filho Fábio Barreto, né? Já foi exibido em Gramado no ano passado (segundo o diretor, não era a versão definitiva), mas ainda não estreou. Será que tem chance de ajudar a empresa do Barreto a não precisar mais ser "eterna beneficiária das leis"?

Outra coisa a se registrar: Manoel Rangel, ao ser questionado sobre quando os filmes brasileiros feitos com leis de incentivos serão exibidos na rede pública de televisão, respondeu que pode ser "a qualquer momento", porque a lei permite que isso seja feito.
Como as questões eram feitas por escrito, não dava pra contrapor, mas é preciso que se lembre aqui: se permite, que seja feito, oras. A Programadora Brasil, iniciativa do CTAv, é um bom começo, mas é preciso ter filme brasileiro na TVE, na Cultura e em todas as emissoras públicas em todos os dias (e sobretudo noites) de cada semana.

O seminário foi revelador porque todos os debatedores falavam sobre anos recentes e a situação atual, com críticas ou defesas dos editais e das leis de incentivo. Com relação à pretensão de estar "Construindo o futuro", como dizia o nome de uma mesa de debate, o seminário foi falho, apesar da boa vontade nas avaliações dos presentes. Nada se falou sobre ações futuras, além de um tradicional otimismo vago.
Se é pra sugerir os próximos passos, vale então lembrar (mais uma vez...) esse ponto que passou quase esquecido por lá - é preciso exibir os filmes brasileiros na rede pública de TV. Se isso não está na agenda como item urgente, sugiro que seja incluído de imediato.
Daniel Caetano