2.5.06

Dinheiro público sem retorno?

Já que o assunto começou na nota abaixo, vale passar o link da matéria do Globo publicada no domingo passado sobre os planos de prorrogação da Lei do Audiovisual (já em tramitação no Congresso). É assustador notar a disposição de alguns (os clássicos...) em fazer a prorrogação ser aprovada sem qualquer alteração na forma da lei. Sim, há toda a questão dos prazos e processos, mas isso não justifica essa cara-de-pau. Há pontos já bastante discutidos que podem ser modificados sim, e isso não é nada complicado - basta que as partes interessadas evitem confundir as questões.
Antes de mais nada, é preciso discutir qual é o retorno apresentado pelo investimento nos filmes. Uma vez o nobre Luiz Carlos Barreto comentou com razão que "o retorno são os próprios filmes!". Pois bem, que se ceda os filmes então! Só faz sentido prorrogar essa lei se os próximos filmes tiverem meios de ser vistos - e um meio simples, como já lembramos mil vezes aqui, é exibi-los na rede pública de televisão.
Como o dinheiro que fez os filmes é público, através da lei, é muito justo que essa lei passe a garantir ao Estado o direito de exibir o filme na televisão sem custos adicionais, não é mesmo?
Caso convenha ao produtor não exibir o filme em rede pública aberta, sempre se pode permitir a alternativa de devolver integralmente o valor dos incentivos, a partir da renda de bilheteria e afins...

Porque se é pra prorrogar uma situação em que a maioria dos filmes não obtém sequer uma média de 50 mil espectadores nas salas de cinema, aí a proposta fica muito esquisita - parece ser uma defesa da manutenção de privilégio mesmo.

Outro ponto importante é o custo dos filmes e o favorecimento a filmes mais comerciais ou menos. Sobre isso, a reportagem traz uma idéia iluminada do veterano Roberto Faria: a de que o recriado prêmio de Adicional de Renda seja destinado somente a filmes feitos sem incentivo de leis fiscais. Se a isso se somar uma restrição maior ao custo dos filmes nas leis (ou seja, reduzir o limite dos orçamentos, barateando os custos), o que pode acontecer é o seguinte: filme com estrutura comercial joga dentro das regras do comércio, tendo o apoio do Adicional de Renda (justo, já que o mercado é reduzido e dominado); filmes menos inseridos no mercado podem ser feitos através de leis de incentivo, com orçamento reduzido e tendo que permitir a exibição em rede pública alguns anos após o lançamento.

Há outras idéias simples e interessantes a serem discutidas. Mas fica difícil se a base da conversa for esse "em time que tá ganhando não se mexe".
Que é um argumento sem sentido, inclusive porque time que tá ganhando não precisa de prorrogação. Não é mesmo?

(já o post é com links do Globo, vale também dar a dica pro pessoal que não é do Rio - saiu hoje uma matéria bem bacana sobre nosso ex-editor Valentoni)
Daniel Caetano