22.6.04

Você sabe que está envelhecendo quando simplesmente não consegue mais acompanhar o fluxo de confusão de ressignificações (ou des-significações) que as imagens vão adquirindo, ao gosto do liquidificador insano, por exemplo, da TV brasileira, na qual o poder autofágico e descaracterizador da enorme mídia mostra-se algo de muito, muito assustador. Em dois dias as seguintes cenas foram testemunhadas:
No Domingão do Faustão, um concurso de "sósias" de Renato Russo. Nele, um cara realmente parecido (em timbre e aparência) entoava Que País é Esse? (sabe como é? "nas favelas/no Senado/sujeira pra todo lado..."), enquanto na platéia um ensandecido Super-Homem balançava os braços loucamente, ao fundo as meninas da aeróbica faziam coreografia para o ritmo da música e, não bastando isso, a cada entoada do refrão-título o sonoplasta mandava aquela vinheta ufanista dos jogos da Seleção ("Brasil-sil-sil!").
CORTE SECO
Mais tarde, celebração do final de Celebridade, na semana final da novela de Gilberto Braga - que nos seus melhores momentos foi uma senhora novela, tanto no retrato ácido e sem meios tons de uma cultura da "Fama", quanto um retrabalhar do folhetim melodramático e seus tipos característicos. Enquanto Braga se explica por não ter feito algo de forte apelo político-social (não?), o elenco inteiro da novela, no palco, reproduz com a platéia e o apresentador-fanfarrão o que poderia facilmente ser uma cena satírica na novela. Poderia - ou é? Já não dá mais pra saber - mas todos parecem comprar o enredo. Será que Braga escreveu a cena?
CORTE SECO
Morre Leonel Brizola. As análises histórico-políticas abundarão por estes dias. No Jornal da Globo, uma longa elegia a este "nome fundamental da política brasileira". Oi? Jornal da Globo? Brizola?
FADE OUT FINAL
Eu não estou mais entendendo nada. Definitivamente, devo estar velho.
Eduardo Valente