3.10.05

O nascimento da modernidade

Bem, fugindo um pouco do assunto "festivais", que já está tomando algumas páginas aqui da revista, segue aqui uma dica musical: graças ao site rapidshare e a uma comunidade dedicada a João Gilberto no orkut, diversos internautas começaram a trocar algumas gravações raras do chamado "papa da Bossa". Já que Coisa mais linda ainda está em cartaz, acho que a dica vale para quem quiser conhecer algumas raridades que podem trazer mais luzes sobre essa tal Bossa Nova do que o referido longa, que, como já escrevi na crítica, funciona mais como crônica de uma turminha do que como registro e análise de um movimento musical e cultural.
É o caso, sobretudo, das primeiras gravações de João Gilberto, cerca de seis anos antes de "Chega de saudade" e "Bim-bom". Muito comentadas e até hoje pouquíssimo ouvidas, as gravações foram postas à disposição de qualquer um que se interessar pelo colecionador Arquimedes Luiz e pela pesquisadora Daniella Thompson. São gravações de 1951 e 1952: quatro delas ("Quando você recordar", "Amar é bom", "Anjo cruel" e "Sem ela") feitas pelo conjunto vocal Garotos da Lua, de que João foi crooner por um curto período, e mais duas outras ("Quando ela sai" e "Meia-luz") em gravação solo do cantor - é curioso notar que as gravações solo soam mais antiquadas do que as com o conjunto.
Mas, principalmente, essas gravações denotam como foi profunda a transformação que, seis anos depois, João Gilberto provocou na música e na cultura brasileiras. Entre elas e "Chega de saudade" há o pulo-do-gato decisivo, que criou aquele biscoito fino e tão bonito que as massas descobriram.
Bom, nem vou me alongar mais, porque muito já se escreveu e também porque dá pra escrever sem parar sobre essa transformação. Mas, pra quem só conhece a forma de cantar que João desenvolveu posteriormente, fica o aviso: a comparação é impressionante.
Daniel Caetano