16.2.04

Saiu no Globo (12/02) o que nos bastidores já se constatava: que a promessa da Prefeitura do Rio de colocar R$ 3 milhões para dar condições ao Arquivo Nacional de cuidar das matrizes expelidas da Cinemateca do MAM, feita publicamente nos jornais em 2002, não passou de um aceno sem fundamento e enamorado pelo marketing de ocasião. Ver a Prefeitura colocar milhões em uma única edição do Festival do Rio (um festival particular, que cobra ingressos caros) e se negar a implantar uma Cinemateca Carioca - com um orçamento que nem de longe se aproxima dos padrões megalômanos de nosso prefeito - vem confirmar o amor incondicional dessa famigerada administração pelos holofotes e fogos de artifício. Quando as películas foram para o Arquivo em 2002 já era óbvio que o Rio precisava não de um novo improviso, de um novo "MAM", mas de um verdadeira Cinemateca Carioca, mantida pelo patrimônio cultural da cidade e voltada para ser referência da memória cinematográfica brasileira. Mas o que dizer de uma prefeitura que tem como proposta retumbante de solução (e símbolo da vocação do Rio para o cinema) uma tal "cidade do cinema" que seria construída no cais do porto, ao lado das águas da Baía de Guanabara? (Será que alguém avisou a eles que a umidade faz mal aos filmes?...)
A ignorância - aliada ao desinteresse da cúpula do Piranhão (antes que a coisa virasse capa de caderno cultural, é claro...) e à rapidez com que o Arquivo Nacional se dispôs a cumprir o urgente papel de "guarda improvisada" - fez com que projetos mais embasados (e os profissionais mais habilitados, vale lembrar...) para a preservação e difusão da memória cinematográfica da cidade fossem simplesmente "arquivados". Um ano depois: o que temos agora? Matrizes em condições precárias, guardadas em um prédio que não foi preparado devidamente para recebê-las, esperando uma promessa vaga + uma política municipal de cultura espelhada num desejo tupiniquim de broadway e efêmeros refletores + projetos consistentes para nossa cinemateca, engavetados por mais uma década ou duas (?) = a certeza de que daqui a uns vinte anos nossa memória audiovisual vai ter se perdido em mais algo em torno de 40% a 60%. Transformar o Arquivo Nacional em um novo sarcófago de filmes foi a solução mais cruel e mais farsante que se poderia ter tido para a crise da Cinemateca do MAM - além de ter perdido o mínimo de organização que o Censo Cinematográfico (bancado pela BR) trinha conseguido trazer ao acervo de matrizes do museu.
(Felipe Bragança)