16.9.02

Da superioridade dos recentes filmes comerciais brasileiros em relação aos filmes de arte – Já estamos sendo brindados com o trêiler do novo filme de Paulo Thiago sobre Carlos Drummond de Andrade. Há pouco tempo entrou em cartaz As Três Marias, filme "autoral" de Aluízio Abranches. Em outra chave, em breve teremos a estréia de Gregório de Matos, filme novo de Ana Carolina. Isso para não falar em Deus É Brasileiro, de Cacá Diegues, que também está por vir. Tirando o quesito qualidade, onde a diretora de Mar de Rosas ganha dos outros com corpos de vantagem, existe uma incrível semelhança entre esses filmes e outros do recente cinema "de arte" brasileiro (podemos pensar em Lavoura Arcaica, por exemplo): existe uma constante negação do presente em temas 'atemporais', legitimados pelo tempo (temática histórica, nobre), pela arte (livro importante, grandes artistas) ou simplesmente pela pretensão temática (a vingança, o Brasil). Curiosamente, nossos filmes comerciais vêm se saindo bem mais interessantes no que diz respeito à contemporaneidade. Se dependêssemos de nossos estetas, um extraterrestre que quiser conhecer o que foi nossa época pelos filmes, jamais descobriria que no Brasil dessa época houve: pitboys, patricinhas, cachorras, pagodeiros, funkeiros, favelas, traficantes, emergentes. Assim como os cenários mudaram: academias, condomínios, escritórios de profissionais liberais transformados num labirinto de baias de compensados, fim do lazer em espaços públicos (praças, por exemplo) para o lazer privado (boates, parques temáticos), as novas leis e novas formas de emprego, nada disso é contemplado em nosso cinema "de arte". Assim, ainda que moderadamente e com matizes diversos (e qualidades idem), três vivas para filmes como Cidade de Deus, O Invasor, O Casamento de Louise e até Avassaladoras, filmes que ao menos nos dizem que estamos vivendo no Brasil, e não numa miríade advinda do rico cérebro de um autor. (Ruy Gardnier)