18.1.03

Ainda chocado com a morte de Pialat, fui nos meus arquivos reler uma entrevista sua para o Serge Toubiana e o Thierry Jousse no Cahiers. Uma entrevista admirável, comandada com mão de mestre e muito jogo de cintura pelos jornalistas, que tiveram dificuldade com o folclórico jeito ranzinza do cineasta. Eu me acabei de tanto rir do mau-humor de Pialat, que, visivelmente desencantado, não parava de criticar o mundo inteiro e reclamar que seus filmes não tinham boas bilheterias. Ele chutou o balde: atacou velhos clássicos, Dreyer, Hitchcock, queridinhos do Cahiers - Nouvelle Vague, Truffaut, Jules et Jim (“um filme execrável”)... acabou chegando no mito Serge Daney, dizendo que sempre o achou um sujeito “geralmente meio anfigúrico”, e nesse momento um dos jornalistas teve que interromper a entrevista : “Preferia que trocássemos de assunto. Daney era meu amigo”. O jornalista, mais tarde, logo depois de mais um ataque totalmente deslocado (dessa vez ao Cabinete do Dr. Caligari), ainda foi para cima do cineasta: “Falemos do senhor. Eu tenho a impressão de que o senhor é uma pessoa muito invejosa. Não seria mais interessante de falar dos seus filmes do que da sua inveja?”. Mais engraçada ainda foi a resposta de Pialat quando Jousse e Toubiana fizeram aquela divagação "à la Cahiers" e classificaram Le Garçu de “filme cubista”: “- Aqui entre nós, vocês também não devem ter uma bilheteria muito boa, não é?”. O homem não era fácil. (Bolívar Torres)